5 Fatos Históricos Que Influenciaram o Xadrez

     

    A equipe de xadrez da Armênia anunciou que não participará das Olimpíadas de Baku, que acontecerão em setembro deste ano. A notícia agitou o mundo enxadrístico, pois os motivos dessa decisão possuem raízes históricas – como falaremos adiante.

    Mas essa não é a primeira vez que um fato histórico muda o curso da própria história do xadrez. Continue lendo e conheça alguns casos:

     

    1- As Olimpíadas de Baku sem o Time da Armênia

    A equipe de xadrez da Armênia é, sem dúvida, uma das mais fortes do mundo. Encabeçada pelo atual número 5 do rating da FIDE, o Grande Mestre Levon Aronian (2792), a Armênia sempre foi uma força a ser temida. Mais que isso: sempre chamou a atenção pelo forte espírito de equipe – em muitas Olímpiadas, mesmo não estando no TOP 3, ou até 5, da competição, acabava por conseguir um lugar no pódio (por exemplo, o ouro em 2006, 2008 e 2012 – além do bronze em 2002 e 2004).

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    Equipe Armênia vencedora das Olímpiadas de xadrez em 2012:

    No retorno para casa, recepção de verdadeiros heróis.

     

    Afora Aronian, Sergei Movsesian (2666); o experiente Vladimir Akopian (2675); Gabriel Sargissian (2679); Tigran Petrosian (2587) ou Tigran Kotanjian (2473) – além de lendas como Rafael Vaganian (2570) ou alguns “novos” talentos como Robert Hovhannisyan (2640); Hovhannes Gabuzyan (2607); Samvel Ter-Sahakyan (2605) – são alguns dos grandes jogadores armênios que já fizeram, fazem, ou farão, história pelo xadrez do país.

    Entretanto, não este ano. A equipe Armênia não irá participar da 43º Olimpíada de Xadrez que acontecerá na cidade de Baku, no Azerbaijão.

     

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    Levon Aronian: número 1 da Armênia e 5º do mundo

     

    Em entrevista para o site de notícias Armen Press, no dia 25 deste mês, o primeiro-vice Presidente da Confederação Armênia de Xadrez, o Grande Mestre Smbat Lputyan (aliás, outra lenda viva do país), declarou, oficialmente, a não-participação do time do país este ano – decisão tomada após uma conversa entre os membros da Federação.

    Em maio deste ano, o presidente da FIDE, Kirsan Ilyumzhinov, havia sinalizado de forma positiva a participação da Armênia, mas logo após essa declaração, o GM Lputyan já deixava claro que a participação, ou não, do time armênio ainda estava em discussão. Agora, com o definitivo posicionamento negativo, sem dúvida, as Olimpíadas sofrem um enorme desfalque.

    Para quem não sabe, o motivo da desistência do time de Aronian possui raízes históricas. No século passado, embora tensões possam ser rastreadas desde muito antes, Armênia e Azerbaijão (país que sediará as Olimpíadas) entraram em diversos conflitos. A região de Nagorno-Karabakh, território azeri, mas de maioria armênia, é o palco da tensão entre os países.

     

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    No detalhe vemos a região de Nagorno-Karabakh (palco dos conflitos) e, à direita, a cidade de Baku – que sediará as Olímpiadas de xadrez este ano. Para o formulário do visto para a Olimpíada, todos os jogadores precisam responder se já visitaram esta região.

     

    Resumidamente, foi entre 1988 e 1994 que as hostilidades em Nagorno-Karabakh atingiram o ápice. Estima-se que 20 mil a 30 mil pessoas já tenham morrido por conta do embate. Um dos motivos do início da violência no local se deu depois que o parlamento da região autônoma de Nagorno-Karabakh votou de forma favorável para a integração do território à Armênia. Desde 1994 a região é controlada por separatistas armênios, com o apoio da Rússia.

    Cada um dos países culpa o outro pelos constantes atritos. Segundo o Ministro da Defesa da Armênia “as autoridades azeris são inteiramente responsáveis pela escalada das tensões” além de “o adversário, com recurso a tanques, artilharia e meios aéreos levou a cabo ações ofensivas tentando penetrar nas linhas defensivas armênias”. Por parte do Azerbaijão, o discurso é o contrário.

    O cessar-fogo foi violado 130 vezes durante a noite, com recurso a morteiros, granadas e metralhadoras. Os bombardeamentos chegaram de território arménio e da zona de Karabakh dominada pelos arménios. O exército azeri viu-se obrigado a responder”, afirmou o Ministro da Defesa do Azerbaijão.

    Mais recentemente, em abril, 30 soldados foram mortos (18 armênios e 12 azeris).

    E não foi apenas o xadrez armênio que teve que lidar com uma notícia difícil. O xadrez brasileiro também. O atual campeão brasileiro, o GM Krikor Mekhitarian (2550), de descendência armênia, alguns meses atrás, em sua página pessoal do facebook, já havia declarado a sua desistência dos Jogos Olímpicos em razão do conflito entre os países.

    2- As Olimpíadas de Erevan e a Tentativa de Golpe de Estado

    Em 1996 a Armênia esteve mais uma vez no centro dos acontecimentos históricos que influenciaram o xadrez. Durante as 32ª Olimpíadas de Xadrez, em Erevan – capital do país desde 1991, com o fim da União Soviética – houve uma tentativa de Golpe de Estado.

    O fato ocorreu depois da contestação da eleição presidencial de 22 de setembro de 1996 – segunda eleição presidencial do país. Apoiada por relatórios externos sobre irregularidades, os principais partidos de oposição se recusaram a reconhecer a reeleição do presidente Levon Ter-Petrossian (que ganhou a eleição com 51,3% dos votos). Depois de uma manifestação em massa na capital em 25 de setembro de 1996, houve uma invasão em massa de prédios do governo – centenas de pessoas foram presas. Entre os manifestantes presos, vários políticos da oposição do governo eleito que foram acusados de encenar um golpe de Estado.

    Enquanto tanques ocupavam as ruas (como nos confidenciou o nosso GM Rafael Leitão, que participou da competição), nos tabuleiros, a Rússia de Kasparov e Kramnik sagrava-se tricampeã olímpica.

     

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    3- A Primeira Guerra e a Ausência de Matches pelo Título Mundial

    Emanuel Lasker, após conquistar o título mundial de Wilhelm Steinitz, em 1894, foi desafiado pela última vez em 1910 por Carl Schlechter. E aí a disputa pelo título mundial entrou numa longa hibernação – decorrente do início da Primeira Guerra Mundial (1914-1918).

    De modo geral, vários fatores levaram a eclosão da Primeira Guerra Mundial. As disputas territoriais entre as grandes potências europeias e a má distribuição de renda, além da produção armamentista crescente, deixava no ar o risco eminente de um confronte no ar.

    Desta forma, ficava impraticável encontrar um lugar tranquilo para um evento como a disputa do título máximo do xadrez – além de vários jogadores terem sentido na pele os horrores da guerra.

    O Campeonato Mundial só retornou em 1921. Lasker foi desafiado e vencido pelo genial cubano José Raúl Capablanca. Com esse fato, Lasker se tornou o campeão mundial que permaneceu com o título ininterruptamente por mais tempo na história: 27 anos.

     

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    Emmanuel Lasker

     

    4- A Segunda Guerra Mundial e o Xadrez Argentino

    Durante as Olimpíadas de Xadrez de Buenos Aires, em 1939, eclodiu a Segunda Guerra Mundial e alguns enxadristas optaram por permanecer em terras hermanas. Essa decisão certamente salvou a vida do judeu polonês Miguel Najdorf, que perdeu toda a sua família nos campos de concentração nazistas.

     

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    Miguel Najdorf

     

    Outro atleta que também escolheu ficar na Argentina (e chegou a morar no Brasil), foi o austríaco Erich Eliskases, representante da Alemanha, que havia se unificado com a Áustria.

    Tais decisões marcaram definitivamente não só a vida dos atletas, mas também impactaram o próprio xadrez argentino, que de uma hora para a outra ganhou alguns dos mais fortes enxadristas de sua história.

    Para se ter uma ideia, Najdorf foi 9 vezes campeão argentino e defendeu seu novo país em 11 edições das Olimpíadas de Xadrez. Já Eliskases representou a Argentina nas Olimpíadas por 4 vezes, em 1952, 1958, 1960 e 1964.

    5- A Segunda Guerra Mundial e o Destino de Paul Keres

    Paul Keres era possivelmente o melhor enxadrista do mundo em 1938, vencendo o Torneio de AVRO, que foi a competição mais forte da época e continua sendo uma das mais fortes de todos os tempos.

    É óbvio que não se pode afirmar com 100% de certeza que Keres seria o sucessor de Alexander Alekhine, mas a sua pouca idade e o alto nível do seu jogo o tornavam o favorito.

    O fato é que não foi somente a suspensão das competições durante o período que minaram as chances de Paul Keres. Os acontecimentos ocorridos durante a guerra o marcaram profundamente e selaram o seu destino.

    Reza a lenda que Mikhail Botvinnik, usando-se de seu grande prestígio com o partido comunista, foi o responsável direto por Paul Keres não ter tido que lutar no front. Especula-se até hoje que esse episódio seja a razão pela qual Keres jamais conseguiu mostrar seu melhor xadrez nos confrontos com o “Patriarca”.

     

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    Paul Keres

     

    Esses são apenas alguns dos fatos históricos que marcaram o xadrez mundial. Você conhecia essa parte da história? Consegue citar outros episódios históricos que marcaram o xadrez? Conte nos comentários!

     

    3 Responder para “5 Fatos Históricos Que Influenciaram o Xadrez”

    • Frederico

      Grande artigo Rafael eu ainda lembro na decada de 90 que eu estava lendo no jornal a sua participação no torneio de Erevan. E muito louvavel esse artigo pelos grandes feitos que o xadrez proporciona mesmo em ambiente hostil.
      E voce Rafael merece os aplausos da comunidade enxadristica por ter amenizado essas tensoes atraves do esporte. Parabéns

    • Igor Cardoso

      Muito interessante. Sempre que tenho um tempo venho aqui no seu site ler os artigos, muitos ricos. Obrigado Rafa!

      • Rafael Leitão

        Obrigado!

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