Como Analisar Com o Computador
É fato que a tecnologia mudou a forma de se estudar xadrez. Se antes um enxadrista precisava consultar uma série de livros como referência, procurar boletins de torneios para encontrar partidas dos adversários (lembro a felicidade do meu pai quando comprou, em 91, o boletim completo do Campeonato Europeu sub-12, que nos deu informação valiosa sobre meus adversários na campanha do título mundial), procurar por livros para treinamento de cálculo e estratégia etc, hoje em dia tudo isso está ao alcance de alguns cliques, seja para entrar em um site com exercícios, assistir vídeo-aulas, procurar partidas dos seus adversários no Chessbase ou – tema deste artigo – ligar sua engine predileta para analisar uma posição.
O que nos leva a uma das questões mais importantes para o estudo moderno de xadrez: como usar corretamente as engines? Essa pergunta tem sido debatida por amadores, profissionais e super treinadores. A verdade é que não há um consenso, mas espero que algumas ideias deste artigo ajudem o leitor a encontrar o método mais adequado para sua personalidade.
As Variáveis
Como usar as engines depende em grande parte de vários fatores como: qual o nível de jogo do enxadrista; se é um trabalho específico de abertura ou simplesmente a análise de uma posição; se você está analisando sozinho ou com outro jogador; se há muito ou pouco tempo disponível. E vários outros fatores semelhantes.
Há várias formas de usar as engines e os métodos podem, inclusive, ser trocados com frequência. Mas desde já é importante esclarecer algo que tenho total convicção: a imensa maioria dos enxadristas usa as engines muito mais do que deveria. O xadrez é algo apaixonante justamente porque gostamos de pensar em um problema e resolvê-lo. Usar as engines a todo momento tira grande parte do encanto do jogo, pois deixamos que o computador resolva esses problemas. E com isso não treinamos adequadamente a tomada de decisões, prejudicando o desenvolvimento das habilidades mais importantes para um jogador de torneios. Mas seria radical demais cortar o uso das análises de computador, já que elas podem melhorar a qualidade da nossa preparação de aberturas e também nos ajudar a melhorar a capacidade de cálculo.
Métodos Recomendados
Então vejamos alguns dos métodos mais interessantes para analisar com o computador:
Método 1
Estudar a posição/partida, formar e anotar suas ideias e depois checar com o computador, que naturalmente mostrará ideias novas. Acrescentar as ideias do computador e analisar de novo sem a ajuda da máquina, repetindo o processo até tirar suas conclusões. Esse é o método clássico e o que provavelmente traz mais benefícios. A desvantagem é que esse método consome tempo, por isso não é recomendável para análises de abertura antes de uma partida.
Método 2
Analisar a posição diretamente com o computador. Esse é o método utilizado por grande parcela dos GMs, especialmente nas análises de aberturas. Aqui há algumas variações possíveis também: configurar para que o computador mostre apenas uma jogada (ele analisa mais rápido e você consegue seguir as análises mais facilmente, mas é possível que lances candidatos importantes fiquem de fora das análises) ou configurar para que mostre vários lances (você tem uma percepção melhor da avaliação e vê mais lances candidatos. Entretanto, as análises podem ficar mais lentas e confusas).
O perigo nesse método é que você se acostume simplesmente a controlar o mouse e não analise a posição de verdade. Tente analisar ativamente a posição, ver as análises do computador sem mover as peças e sugerindo jogadas (mesmo que não sejam recomendadas pela máquina).
Método 3
O terceiro é um interessante método híbrido, que já mostrei em um vídeo. Trata-se de configurar a tela de análises da máquina de forma que apenas a avaliação do computador seja visível. Conforme você analisa e coloca ideias, você verá as mudanças na avaliação. Se um lance mudar muito a avaliação, você já tem automaticamente um bom exercício em mãos (tente descobrir por que a avaliação mudou tanto). A desvantagem aqui também é que é um método mais demorado que analisar diretamente com o computador.
Método 4
O último método sugerido é o ideal para quem tem um treinador ou parceiro de análise. Um dos enxadristas tem acesso às análises de computador e outro fica com o tabuleiro em frente. Dessa maneira temos o melhor dos dois mundos. Muitos enxadristas da elite utilizam esse sistema. Conforme podemos ver em uma das poucas imagens disponíveis do treinamento entre Kasparov e Carlsen, era assim que eles treinavam (apesar de ficar claro que o Carlsen também estava usando o computador).
Quando preparei o GM argentino Rubén Felgaer para a Copa do Mundo de 2011, utilizamos esse método por duas semanas, com bastante sucesso.
O importante é encontrar o método mais adequado para você e variar de vez em quando, caso sinta necessidade.
Qual o seu método favorito? Prefere um outro sistema que não está listado aqui? Deixe suas ideias nos comentários!
Escrito por Rafael Leitão em 12.01.17
Bacana, tentarei testar os quatro.
excelente artigo. Eu faço o método 4 no estudo de damas, e não sabia que havia algo que referendasse o meu método até então.
Eu prefiro analisar sem o computador, porque normalmente não consigo entender uma série de lances que o computador recomenda, por mais que me esforce. Por exemplo, tem hora que o "pau tá quebrando" no meio jogo e o computador pede para mover o rei para uma casa lateral na primeira fila, sendo que eu não consigo enxergar nenhum risco para o rei na casa onde ele estava. É claro que seu eu seguir a análise poderei entender esse lance (talvez...), o problema é que muitas vezes esse entendimento so virá após uma série de lances onde seria quase impossível para um mero mortal como eu calcular toda a sequência numa partida jogada. Talvez por isso eu não seja um GM, nem MI, muito menos MF.
Persevere, Fernando. Você pode chegar lá!!!
Adorei e é esse mesmo o sentimento que temos com o peixe, ainda mais agora que ele tem os mesmos poderes da leela. Mais emblemático é o 0.0 dele quando a gente vê que no tabuleiro que um dos lados tem vantagem.