Entrevista Com Murilo Salustiano

     

    MAIS UM DOS ENXADRISTAS QUE CONDUZIRÃO A TOCHA OLÍMPICA: MURILO GIMENEZ SALUSTIANO

     

    Seguindo nossas entrevistas com os enxadristas que conduzirão a Tocha Olímpica nas Olimpíadas do Rio de Janeiro, a conversa é hoje com o simpático Murilo Gimenez Salustiano. Empresário e atual presidente de um dos Clubes de Xadrez mais tradicionais do Brasil, o Clube de Xadrez de Curitiba – que este ano fará 78 anos! –, Salustiano é também voluntário num projeto de xadrez que atende crianças do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental.

     

    Academia: Há quanto tempo você joga xadrez e como aprendeu?

    Salustiano: Vamos lá: aprendi jogar entre 11 e 12 anos. Houve uma Clínica de Xadrez Na escola que eu Estudava (Escola Estadual Professor Nilo Brandão). Foram quatro sábados e aprendíamos o básico do Xadrez. No final do curso o Professor mostrou a partida da Ópera de Morphy e vi qual lindo era o xadrez. Mas nos idos de 1982-1983 a maior dificuldade era ter com quem jogar na escola ou no Bairro. Comecei a ganhar dos amigos de escola, dos amigos do Bairro e fomos atrás de novas aventuras. Comecei a jogar os Torneios Infantis da Biblioteca Pública do Paraná onde encontrei outras crianças e adolescentes que tinham a mesma vontade de aprender mais. Na época não tinha condição de comprar um jogo de xadrez e os meus primeiros ensaios foram feitos com papelzinho recortado, onde escrevíamos as peças no verso.  O meu primeiro jogo de peça tridimensional viria anos mais tarde, quando já jogava em Torneios…

     

    Academia: E mesmo depois, com trabalho e faculdade, você continuou jogando?

    Salustiano: Não, a minha vida foi curta no xadrez. Tive que fazer, e creio que fiz, a opção certa. No segundo ano do Ensino Médio eu já trabalhava 9-18 horas e estudava no período da noite. Tive que abandonar o  estudo do xadrez e aos poucos abandonar os Torneios Também. Mesmo assim tive a oportunidade de 1987 sagrar-me Campeão Paranaense Estudantil. Aos 16 anos estava aprovado na Universidade e Trabalhando durante todo o dia. E estudando a noite. Ficou impossível de pensar em Xadrez. Fiquei uns 10-11 anos totalmente afastado e quando voltei no primeiro Torneio lembro que encontrei um tal de  Alexandr Fier. Perguntei quem era. E me falaram. Fique com medo! Foi muito legal ver todo crescimento dele.

     

    Academia: Algum história do Fier criança?

    Salustiano: Eu tive pouco contato com ele criancinha. Começou a jogar justamente quando parei. Eu conhecia o pai dele, o Luciano, e lembro que falei, “ufa que SORTE QUE NÃO É O PAI”. Sorte nada, me falaram. Você ia preferir jogar com o Luciano… A única coisa quanto ao Fier é que pra nós todos chamamos ele de Fierzinho… e o Luciano, sim, de Fier.

     

    Academia: E hoje em dia você é presidente do tradicional Clube de Xadrez de Curitiba, certo? Em meio a tantas facilidades do mundo virtual, o Clube de Xadrez físico ainda consegue sobreviver?

    Salustiano: Extremamente feliz que nosso Clube tenha contribuído ativamente para construção de três GM´s: Sunye, Fier e Everaldo. É uma luta insana. Precisamos matar um leão por dia, ou por semana, dependendo do Clube. Eu acredito que assim como estádios de futebol os clubes deveriam se tornar em arenas, com atividades distintas, e que possam contribuir com a receita final do Clube. Nosso Clube  passou por sérias dificuldades financeiras de  gestões que não viram a  transformação  de comportamentos e demoraram para tomar ações mais efetivas. O amigo e antecessor  Acyr Calçado  começou a trazer atividades como Torneios Espetinho/Noite árabes/Torneio da tainha e Torneios Feijoadas, onde mesmo pessoas fora do meio enxadrístico passaram,  ou voltaram, para rever os amigos enxadristas. A questão cibernética afeta mais a questão mobilidade. Para você sair hoje de casa e buscar estacionamento, dirigir ou se locomover em grandes centros urbanos, é bastante complicado. Acredito que são dois meios distintos de jogar xadrez. Nada substituí a emoção de se jogar ao vivo. Sentir-se pressionado, respiração ofegante, várias pessoas olhando. O olhar do adversário. O xadrez online favorece pessoas que estão fora dos grandes centros e populariza o jogo. E permite que joguemos com pessoas de todos os cantos do planeta, fazendo novos amigos. Resumindo: acho que essas duas “modalidades” são complementarem e podem, sim, viverem juntos. Devendo, porém, os Clubes de Xadrez adaptar-se a este novo momento. O maior medo do xadrez, não creio, seja o xadrez online, mas, sim, outros jogos que fazem com que crianças eventualmente não se interessem por xadrez. Mas isso não se confirmou e o xadrez vem crescendo forte entre as crianças Brasil afora e, principalmente, aqui em nossa cidade. O Foco dos Clubes deve ser dispor de espaço para que haja treinamentos para aqueles que queiram se fortalecer. Fomos eleitos nos últimos 4 anos o melhor Clube de Xadrez do Brasil. Isso nos honra, mas nos enche de responsabilidade – em como podermos ajudar nossos clubes irmãos Brasil a fora. São pouquíssimos Clubes Particulares como o nosso e a maioria são públicos. E a cada 4 anos sofrem ingerências políticas eleitorais…

    recursos do adversário

    Academia: E como você foi indicado para a condução da Tocha?

    Salustiano: Eu adoro esportes. Mesmo não tendo sido um atleta de elite, sei da dificuldade que muitos destes que aqui estarão representando seus países enfrentaram para aqui estar. Eu admiro o trabalho, a dedicação, e a busca da superação de cada um no seu melhor. Houve chamadas no Rádio e TV na promoção de um Banco dizendo por que você deveria carregar a Tocha Olímpica. Uma pessoa deveria lhe indicar. Então minha querida mãe o fez compartilhando a história de um jovem garoto que parou de jogar xadrez devido à necessidade de trabalhar, mas depois, pouco mais velho, voltou a colaborar para ensinar criança. Não há alegria maior que ver uma criança sorrindo por algo que você pode fazer. Pagamento são sorrisos e abraços. Este projeto foi inspirado muito no Filme Cavaleiros do Sul do Bronx. Onde o Professor consegue através do Xadrez transformar o futuro e os sonhos das crianças. Penso comigo que se puder ajudar uma delas se tornar um ser humano melhor, todo esforço e dedicação já valeu a pena. Na outra esfera, enquanto Presidente do Clube, estamos buscando alternativas para que crianças carentes possam frequentar o Clube, serem engenheiros, médicos, professores advogados e até enxadristas. Se me permite, a minha história enquanto Presidente remove ao passado… Eu, quando era criança, não tinha dinheiro para pagar mensalidade do Clube. Assim, não podíamos entrar, nem jogar. Quer dizer, entrar dava-se um jeito. Entrávamos escondido pelo 8º andar e subíamos pela escada. E para jogar ficávamos assistindo diversas partidas até que alguém acabasse e que pudéssemos jogar. O que poderia ser triste foi um ótimo aprendizado. Ficávamos vendo gente muito mais forte que nós jogando. Não desistimos do sonho e alguns desses amigos transformaram-se em Mestres Nacionais e Campeões de seus Estados. Quando assumi como presidente voltei ao passado e, desde então, nenhuma criança foi barrada. Ao contrário: estamos convidando crianças que queiram fazer parte do nosso time. Não sei se vocês sabiam, mas Walt Disney morava perto de um Parque de Diversões e por ser pobre nunca pode visitá-lo. O que podia se transformar em ódio fez com que ele fizesse o Maior Parque do Mundo. E parafraseando uma frase que vi do Kasparov, que disse que meu melhor PROFESSOR foi o Karpov, tive a felicidade de ter na minha geração o MI Rodrigo Disconzi da Silva e o GM Everaldo Matsuura, dentre outros, que fizeram com que muito de nós estudássemos ao extremo para tentar ganhar deles.  A nova geração de GM´s APRENDEU QUE DIFUNDIR O CONHECIMENTO É O MAIS IMPORTANTE. para que tenhamos  enxadristas cada vez mais forte

     

    Academia: E as expectativas para a condução da tocha. Como estão?

    Carregar a tocha olímpica numa Olimpíada em seu país é um sonho… O Processo demorou cerca de 4 meses e foi  emocionante quando recebi a notícia  confirmando que ia ser um dos condutores. O objetivo é que possamos colaborar com a divulgação do Espirito Olímpico e também do nosso esporte – o Xadrez.

     

    Academia: como foi seu empate com o Rafael Leitão durante uma simultânea?

    A partida com o Rafael foi super legal. Ele esteve em nosso Clube quando tinha sido Campeão Brasileiro e após uma única oportunidade eu aproveite e arranquei com um feliz empate…

     

    Academia: você gostaria de deixar alguma mensagem para os leitores da Academia?

    Aos que estão aprendendo na Academia usem seu conhecimento. Não só pra jogar torneios, mas também para ensinar alguém. Essa rede do bem que estamos construindo. O pouco que sabemos pode ser muito para alguém. Essa é a rede do bem é que devemos incentivar. Um grande abraço.

     

    Escrito por Equipe Academia de Xadrez Rafael Leitão 14.04.2016

     

     

     

     

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