Proposta Indecente?
Ontem
Nos primórdios do Campeonato Mundial de Xadrez, no final do século XIX, começo do século XX (1886-1946), a disputa era conduzida de uma maneira quase informal: se um enxadrista se achasse forte o suficiente, ele (ou seus amigos; benfeitores; mecenas; etc,) poderia financiar um match para desafiar o reino do Campeão Mundial.
Portanto, não havia um sistema formal de qualificação ou de classificação para o título máximo do xadrez. O que importava era: ser um jogador conceituado e conseguir o montante do prêmio pedido por aquele que fosse o atual Campeão Mundial.
E foi assim que Zukertort e Chigorin conseguiram desafiar Steinitz; Tarrasch e Marshall desafiar Lasker – dentre tantos outros exemplos.
Mas esta forma de disputa, por exemplo, também impossibilitou que Nimzowitsch e Rubinstein enfrentassem o genial cubano Capablanca – que exigia 10 mil dólares como bolsa para o evento.
Alekhine, que conseguiu reunir a quantia desejada por Capablanca, e acabou destronando o cubano, foi o último Campeão Mundial a alcançar o título através deste sistema. Após a morte de Alekhine (1948), o Campeonato Mundial passou a ser organizado pela FIDE.
Hoje
Em Abril o escritório da FIDE, em Atenas, recebeu uma proposta (no mínimo indecente) do Presidente da Confederação Russa de Xadrez: a sugestão de que o Campeão do Mundo deveria, no futuro, ser autorizado a “aceitar o desafio de qualquer jogador que possa contribuir para o fundo de prêmios e os custos de holding do jogo”. Desta forma, a FIDE iria receber 50% do prêmio. A proposta voltou aos holofotes recentemente, pois essa será discutida agora, em Setembro, no Congresso da FIDE em Baku – durante as Olimpíadas de Xadrez.
Abaixo, uma transcrição da proposta enviada à FIDE pela Federação Russa de Xadrez (RCF):
Para: Presidente da Comissão FIDE para Campeonatos do Mundo e Olimpíadas (OMA)
Mr. GEORGIOS Makropoulos
Prezado Mr. Makropoulos,
A Confederação Russa de Xadrez solicita à Comissão que considere e (se necessário) melhore e aprove as abaixo mencionadas alterações ao atual sistema de determinação do campeão mundial de xadrez no 87ª Congresso da FIDE (04-14.09.2016, em Baku, Azerbaijão). A RCF sugere a adição de um artigo a regra que rege o Campeonato Mundial de Xadrez, afirmando que o campeão mundial de xadrez pode aceitar o desafio de qualquer jogador que possa contribuir para o fundo de prêmios e os custos de realização da partida.
Com isto uma série de condições básicas devem ser cumpridas:
O presidente da FIDE teria o poder de vetar qualquer jogo proposto. Qualquer proposta de match para o Campeonato do Mundo seria realizada sob os auspícios da FIDE e de acordo com as regras da FIDE.
50% do prêmio irá para o FIDE.
A partida deve ser realizada antes do final do atual ciclo da FIDE, ou seja, antes de um novo desafiante ser determinado pelo próximo Torneio de Candidatos.
Vice-presidente da FIDE
Presidente da Federação Russa de Xadrez [assinatura] Andrey Filatov
Na mesma noite o secretário-geral da PCA (Profissional Chess Association), Aleksandar Colovic, enviou a seguinte nota para o portal Chessbase: “A próxima Olimpíada, em Baku, pode vir a ser um evento histórico e em mais de uma maneira”, escreveu. “A proposta oficial da Federação Russa de Xadrez para modificar as regras existentes do ciclo do Campeonato do Mundo, se aceita for, vai virar o mundo do xadrez de cabeça para baixo”. E ainda acrescentou: “Nós, da PCA, acreditamos que esta proposta é prejudicial para o xadrez em mais de uma maneira e nós expressamos nossas opiniões na petição que estamos divulgando junto com esta nota”.
Abaixo, a nota oficial da PCA:
A Federação Russa de Xadrez apresentou uma proposta oficial ao Congresso da FIDE para uma adição às regras atuais do ciclo do Campeonato do Mundo: qualquer um, garantindo um prêmio de fundos necessários, pode desafiar o Campeão do Mundo.
Nós, da PCA, acreditamos que essa ideia é totalmente prejudicial para o xadrez. E por uma série de razões, dentre as quais:
– O Campeão do título mundial deve ser alcançado somente através de um ciclo de desporto adequado, especialmente num momento em que o xadrez é cada vez mais reconhecido como um esporte. A proposta RCF vai contra a tradição do xadrez e contra o próprio espírito do xadrez moderno. Embora comprar o direito para o jogo fosse uma prática comum há 100 anos, era mais uma necessidade triste do que um bom sistema.
– Encenar um jogo “comercial” prejudicaria gravemente o apelo da partida ciclo regular. Como as coisas estão, a disputa do título é um evento único que é realizada a cada dois anos e que atua como um catalisador para todo o mundo do xadrez. Mesmo assim, é muito difícil levantar fundos adequados para o Campeonato Mundial – nós nos lembramos de vários exemplos do passado recente e estamos testemunhando os mesmos problemas agora. Quem estaria interessado em pagar para o ‘jogo regular’ se ele já não é um evento único? Quem iria organizar os candidatos nestas circunstâncias? Quem iria considerar o xadrez como um esporte adequado para uma empresa investir nele?
– O Campeão do título mundial seria desvalorizado e, mais importante, a imagem de xadrez iria sofrer muito em todos os níveis e em todo o mundo. Ele também iria colocar os jogadores em termos grosseiramente desiguais: alguns teriam que lutar jogar suas chances contra os melhores jogadores do mundo no ciclo regular, enquanto outros iriam comprar a sua chance pelo título através do dinheiro. Isto é completamente inaceitável. Também poderia trazer um descrédito para o nosso nobre jog, abrindo a porta para problemas que não podemos sequer prever agora.
– A proposta RCF iria inevitavelmente atrapalhar o ciclo do Campeonato do Mundo. Seria também limitar a participação do Campeão do Mundo em outros eventos, como ele teria de dedicar a maior parte do seu tempo à preparação / recuperação após os jogos. Novamente, isto não é certamente desejável.
A ACP se opõe fortemente as alterações no ciclo do Campeonato Mundial que minam o sentido desportivo e o valor único do título de Campeão Mundial de Xadrez. Nossa opinião é apoiada pelos resultados da sondagem ACP – 2016, onde mais de 80% dos profissionais de xadrez, claramente, desaprovaram a ideia de comprar os direitos para a disputa do título. Se você compartilha a nossa visão, por favor, ajude na luta contra esta proposta e faça parte da posição ACP através da assinatura em nossa petição. A proposta RCF pode ser aprovado já em Setembro e nós sentimos que o mundo do xadrez tem que tomar uma posição clara sobre este assunto o quanto antes.
E você, o que acha?
FONTES
Escrito por Equipe Academia de Xadrez Rafael Leitão 21-08-2016
Ridiculo meramente calculista sem base qualitativa quem propôs um bossal em xadrez de nível
Qual a sua opinião sobre tal proposta mestre ?
Ridícula!
graças a esse sistema proposto não tivemos a revanche capablanca e alekhine
Essa proposta da federação Russa é uma piada!
Essa proposta da federação russa, ao meu ver, não tem chance alguma de ser aprovada. Seria um retrocesso e uma mudança prejudicial ao xadrez como esporte! A conquista do direito de ser o desafiante do campeão mundial, ocorre por mérito e não por dinheiro!
Mostra como a Rússia tem ficado ultrapassada no quesito ESPORTIVO.
Ontem tivemos dopping, hoje propostas incoerentes que remetem ao retrocesso do atual sistema de disputa e o que será que vão fazer amanhã?
Muito bom artigo!
Muito "estranha" esta proposta dos russos, para dizer o mínimo.
Comprar o direito de desafiar o campeão mundial é muito tosco.
Acredito que o sistema atual é o ideal. Se algo tiver que melhorar, que seja seguindo os moldes atuais.
Concordo com todos, mas confesso que em algumas grandes exceções eu gostaria de que houvesse essa possibilidade. Tipo, quem não queria ver logo Carlsen x Anand já em 2011? Ou Carlsen x Caruana atualmente. Ou quem sabe um utópico Kasparov x Carlsen :D? Acredito que nestes casos ai essa mudança seria de certa forma bem vinda. Lembrando que o próprio Carlsen desistiu de disputar o candidatos por achar a disputa injusta. (http://www.tabuleirodexadrez.com.br/06-11-2010-magnus-carlsen-nao-vai-disputar-o-ciclo-do-campeonato-mundial-de-xadrez.html)
Mas, como abre uma tremenda brecha pra politicagem, conflito de interesses , etc. Melhor não ariscar.
Proposta absurdamente mercenária, incompatível com a nobreza do Xadrez, enquanto esporte. Uma violação de direitos e méritos. Só poderia partir da Rússia, ou seja da cúpula vermelha dos dirigentes russos e, não do povo russo. Ainda não esquecemos como a Guerra Fria foi disputada no tabuleiro de xadrez. Hoje, a Guerra Fria é lembrada como o período em que a humanidade esteve muito perto de se aniquilar. O que os Russos desejam agora? -- Aniquilar o xadrez!!!