Alguém deve ter notado (ou ao menos torcemos para isso) que, misteriosamente, após a nossa cobertura das 6 primeiras rodadas do emocionante Torneio de Candidatos (clique aqui e aqui), simplesmente não houve mais notícias sobre evento. Aliás, não houve mais notícia nenhuma.
UTILIDADE PÚBLICA
[Procura-se: morto ou morto]
Fomos acometidos, por volta do dia 20/21, por fortes dores de cabeça, febre, manchas vermelhas na pele e outros sintomas que vocês já devem imaginar. O vírus Zika, transmitido pela picada do mosquito Aedes aegypti, o mesmo da famosa dengue, foi o responsável pela nossa queda imediata na cama – e ainda hoje, 10 dias depois do susto, ainda convivemos com alguns dos desconfortos (este texto vai sendo escrito por uma leve dor de cabeça e certa falta de ar). Fica aqui o vídeo feito pelo Ministério da Saúde, e com o Dr. Dráuzio Varella, relembrando a importância de acabarmos com os nascedouros do mosquito. Sim: A Academia Rafael Leitão também é utilidade pública – até porque, se pegarmos alguma coisa do tipo novamente só levantamos quando o Carlsen estiver deixando a coroa para o Wei Yi…
CANDIDATOS 2016: PRESSÕES E IMPRESSÕES
É lógico que não faremos uma retrospectiva de todas as rodadas que acabamos por força não cobrindo. Além do trabalho hercúleo, não existiria nenhuma graça, haja vista que a competição já acabou e todo mundo aqui já sabe o que aconteceu. A única coisa que podemos fazer agora é oferecer alguns breves comentários – que vão das observações a divagações, pois acompanhamos as partidas diretamente da cama, com um soro caseiro do lado e uma canja do outro, então não dá para saber até onde conseguimos realmente seguir as rodadas ou o que já é uma visão de agora, depois de do fim.
Primeiramente que as torcidas da Redação d´Academia estavam divididas entre: a vitória de Caruana ou Karjakin, mas não a de Anand (não! De novo não!); as derrotas do Nakamura; e os empates do Giri. E, de certa forma, obtivemos certo sucesso.
Sobre o campeão do Torneio e próximo desafiante ao título mundial, Sergey Karjakin, é, obviamente, difícil contestar sua vitória. Aqueles que desejam um confronto de Caruana e Carlsen, apostavam no interessante embate entre dois estilos mais distintos – o, digamos, técnico de Carlsen e o agressivo de Caruana. Karjakin, neste meio, poderia lembrar, de longe (talvez bem de longe), aquela famosa máxima do pensador contemporâneo Galvão Bueno sobre algum time de futebol europeu (normalmente a Alemanha): “eles não jogam futebol. Jogam algo próximo ao futebol. Mas que dá certo”.
[O Desafiante de Magnus Carlsen: Sergey Karjakin]
O Jogo de Karjakin não é daqueles que arrasta multidões e gritos de olé. Mas, do que adiantaria ser mais emocionante como um Nakamura e perder? Máxima por máxima, vale mesmo a do ex-campeão mundial Tigran Petrosian sobre questionado sobre a “falta de linhas interessantes” em suas partidas: “Eu poderia ser mais interessante. E perder”. Além do mais, essa visão pragmática sobre o jogo de Karjakin nos parece, de certa forma, equivocada.
Olhando em retrospectiva, o russo demostrou desde o início não só uma força de vontade considerável e desejável para um desafiante ao título, além de um xadrez muito interessante – fugindo da teoria mais pesada, mas sem deixar de criar posições atraentes. A vitória de Karjakin em cima de Anand na quarta rodada (junto com os confrontos diretos contra o concorrente Carruana) foi, sem dúvida, um dos seus melhores momentos no torneio (na partida seu 9.h4 pode não ter causado gritos de olé, mas com certeza levantou a torcida). Por outro lado, também foi contra Anand que Karjakin mostrou o inverso da moeda. Na décima primeira rodada, numa posição que muitos davam como empate, Karjakin, depois de apresentar um xadrez muito abaixo do esperado, jogou mal numa posição crítica do final e deixou que Anand brilhasse com uma técnica invejável (veja a partida aqui).
[Faltou pouco para Anand…]
Há quem use esta vitória de Anand, ou contra Svidler na sexta (aqui) e Aronian (aqui) na nona, para lamentar o fato que não teremos mais um encontro entre o indiano e Magnus Carlsen.
Evidentemente que se Anand tivesse mantido o nível destas partidas a vaga seria, mais uma vez, dele. Entretanto, assim como Karjakin, Anand também não foi regular durante a disputa (talvez de todos os competidores, Karjakin tenha sido exatamente isso: o mais regular. Sem nada de excepcional). Mas ainda sobre Anand, o jogador que venceu Karjakin e Svidler de forma memorável não poderia perder uma partida como a que perdeu para Nakamura – um verdadeiro balde de água fria para os seus fiéis fãs (clique aqui e veja a partida).
[Falta alguma coisa para Caruana…]
Assim como Anand, o outro jogador que chegou perto de conseguir o direito de desafiar Carlsen, Fabiano Caruana, também teve seus altos e baixos. Com vitórias expressivas como contra Nakamura na oitava rodada (aqui) ou justamente Anand na décima rodada (aqui), deixou a desejar nas oportunidades que desperdiçou – a partida da sexta rodada contra Karjakin é um exemplo disso (aqui). Mais uma vez: ponto para Karjakin, que teve “misturado” na sua regularidade uma boa dose de resistência para escapar de posições duvidosas.
[A partida decisiva: Karjakin x Caruana]
E, ironia do destino, a segunda partida entre Karjakin e Caruana calhou de ser na última rodada e, com isso, deixando a disputa pela vaga de desafiante ainda mais emocionante – partida ao melhor estilo “o vencedor leva tudo” (já que para Caruana, de negras, só lhe interessava a vitória). E foi bonito de ver: Karjakin não se “escondeu” e jogou 1.e4 – prontamente respondido com 1… c5. Nas palavras do nosso GM Leitão: “O Torneio de Candidatos 2016 teve um final épico e um merecido vencedor. Os deuses do tabuleiro deixaram, como que por um capricho, o encontro decisivo entre os líderes para a última rodada. E que partida! Caruana complicou o jogo, escolhendo uma complicada variante da Siciliana. E conseguiu o tipo de posição que queria: tensa e desequilibrada” (veja essa emocionante partida aqui). Nesta partida Caruana mereceu, pelo espírito de luta demonstrado, levar o ponto e a vaga. Mas Karjakin mereceu ainda mais: o golpe final realizado no apuro de tempo (37.Txd5!) não deixou dúvida de quem, pelo bem ou pelo mal, deveria ser o desafiante.
E é como dizem os portugueses: “agora Inês é morta”. O que esperar do encontro Carlsen x Karjakin? É claro que não será desinteressante ou desprovido de luta. Entretanto, é difícil imaginar que teremos desta vez o desafiante ideal para enfrentar Carlsen – embora o campeão tenha jogado alguns torneios para se esquecer no ano passado, ao final, acabou salvando a temporada e seu xadrez ainda parece estar consideravelmente à frente dos outros jogadores.
Como Karjakin irá se portar nas posições tranquilas que o Campeão Mundial sabe jogar tão bem? Como será sua preparação nas aberturas (Sabendo que durante o torneio de Candidatos Karjakin, na maioria das vezes, fugiu da teoria pesada e quando entrou em posições mais teóricas – como, de negras, a Índia da Dama – acabou passando por alguns apuros)? Questões que teremos que esperar até o final do ano para termos uma resposta.
E aí? Quem será o Campeão?
EM TEMPO (P.S.)
De toda maneira, o que com certeza não irá acontecer no final do ano, será um match empatado. Até porque todos os empates já ficaram durante o torneio de candidatos com ele, Anish Giri – 14 empates. Se não candidato para o título mundial, ao menos fortíssimo candidato para o Prêmio Nobel da Paz.
FONTES:
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Escrito por Equipe Academia de Xadrez Rafael Leitão 03.04.2016
Muito boa a sátira no final com o Anish Giri! kkkkkk
Realmente, achei muito estranho essa sequência de empates por parte dele. Será tudo isso medo de perder?