Grandes Potências do Xadrez: França
A França é uma potência no futebol e no xadrez não é diferente. O país possui uma gigantesca tradição enxadrística com início no século XVIII, mantida até os dias de hoje com alguns destaques na elite mundial. Atualmente, a França conta com 51 Grandes Mestres e um total de 436 enxadristas titulados.
História
Ainda nos séculos XVIII e XIX, o Café de la Régence, em Paris, foi o grande centro do xadrez mundial.
GM Rafael Leitão visitando o Café de la Regence em 2018
Deste modo, os enxadristas franceses foram fundamentais para a evolução dos conceitos sobre o xadrez, entre os quais se destacam:
Philidor
François André Danican Philidor (1726 – 1795) foi o melhor enxadrista do mundo no século XVIII.
Frequentava o Café de La Régence, onde mostrava sua força no xadrez. Sua superioridade ante os rivais era tão grande que poderia jogar contra eles dando material de vantagem.
Sua maior contribuição ao desenvolvimento da técnica no xadrez foi o livro: “L`analyse du jeu des Échecs”, onde pela primeira vez foi visto o termo “plano”, tão natural para os jogadores de hoje.
Na comparação com o pensamento predominante do momento (Escola Italiana) a frase de Philidor: “Os peões são a alma do xadrez”, foi uma revolução na forma de pensar o jogo. O enxadrista também foi o primeiro a dar a importância ao desenvolvimento de todas as peças e a fazer estudos sobre finais.
Além de enxadrista, Philidor também foi um compositor musical prestigiado e fundou a Ópera Cômica na França.
La Bourdonnais
O primeiro match para definir o melhor enxadrista do mundo aconteceu em Londres, Inglaterra, entre 1834 e 1835. Na ocasião, o francês Louis Charles Mahé de La Bourdonnais (1795 – 1840) venceu o irlandês Alexander McDonnell com 45 vitórias, 27 derrotas e 13 empates. Algumas fontes dizem que foram 44 vitórias, 30 derrotas e 14 empates.
De todo modo, La Bourdonnais foi o melhor enxadrista do seu tempo. O campeão era de uma família nobre, que acabou perdendo todas as riquezas. Isso o obrigou a ganhar a vida como jogador de xadrez, uma ocupação ingrata mesmo para os melhores enxadristas da época.
Em 1833, publicou um manual: “Novo esboço do jogo de xadrez”, no qual ensinava questões importantes sobre como calcular variantes. Em 1836, o enxadrista fundou a primeira revista apenas sobre xadrez: “Le Palamede”.
Saint-Amant
Pierre Charles de Saint-Amant (1800 – 1872) era um comerciante de grande reputação e, assim como todo bom enxadrista da época, era frequentador do Café de La Régence. Também era o representante da França para assuntos sobre o xadrez internacional.
Em 1843, disputou um match contra o inglês Howard Stauton para definir o sucessor de La Bourdonnais. As partidas aconteceram no Café de La Régence, com a presença de um grande público. Os franceses estavam confiantes na vitória, pois Saint-Amant havia derrotado Staunton por 3,5 x 2,5 poucos meses antes.
No entanto, Staunton começou arrasador: sete vitórias e um empate. O inglês manteve a vantagem até finalizar o confronto com onze vitórias, seis derrotas e quatro empates. Após a derrota de McDonnell, os ingleses deram o troco nos franceses. Sendo assim, o francês Saint-Amant foi “só” o segundo melhor enxadrista do seu tempo.
Alekhine?
Ao longo da história, por diversas razões, a França recebeu inúmeros enxadristas fortes oriundos de outros países, em especial da União Soviética. É o caso de Dawid Janowski (desafiante de Lasker em 1910), Savielly Tartakower e Andrei Sokolov. Este último perdeu a final do Torneio de Candidatos de 1987 para Anatoly Karpov.
Contudo, o estrangeiro mais emblemático é Alexander Alekhine. Em 1919, o enxadrista russo já estava entre os melhores do mundo quando foi acusado de espionagem em seu próprio país. Alekhine acabou preso na então União Soviética por um breve período. Por fim, recebeu autorização do governo para viajar ao ocidente em 1921 e nunca mais retornou.
Anos mais tarde conseguiu a cidadania francesa e passou a representar o país em competições internacionais. Tornou-se campeão mundial em 1927 ao vencer José Raúl Capablanca com 6 vitórias, 3 derrotas e 25 empates.
Representou a França em cinco Olimpíadas de Xadrez na década de 1930. Perdeu o título mundial para Max Euwe em 1935, mas recuperou a coroa em 1937. Depois manteve o título de campeão mundial até o seu falecimento, em 1946.
Tempos modernos
Vachier-Lagrave
Os anos passaram e a França segue com enxadristas de destaque. Maxime Vachier-Lagrave tem o oitavo melhor rating do mundo (2.779 pontos, lista da FIDE – julho 2018). No entanto, o francês foi o número dois no ranking internacional após vencer a Sinquefield Cup, em 2017, na frente do atual campeão mundial, Magnus Carlsen e do ex-campeão Viswanathan Anand.
Curiosamente, mesmo com um dos maiores rating do planeta, o melhor enxadrista da França ainda não conseguiu disputar um Torneio de Candidatos. Os dois finalistas da Copa do Mundo garantem vaga direta à competição. O francês já esteve próximo em algumas ocasiões, porém, sempre ficou no quase. Em 2017, chegou até as semifinais e esteve a uma vitória da classificação, mas foi derrotado por Levon Aronian (Armênia).
Vachier-Lagrave caiu nas quartas de final para Anish Giri (Holanda) na Copa do Mundo de 2015. Já em 2013, mais uma vez esteve a uma vitória do Torneio de Candidatos, porém, foi eliminado nas semifinais para o ex-campeão mundial Vladimir Kramnik (Rússia).
O francês também disputou a Copa em 2011 – eliminação na segunda fase – e em 2009, quando caiu nas oitavas de final para o israelense Boris Gelfand.
Bacrot
Etienne Bacrot está com 2.710 pontos de rating FIDE e é o atual número 35 do mundo. Seu melhor momento foi em 2005, quando fez uma Copa do Mundo espetacular ao chegar até as semifinais, sendo eliminado por Levon Aronian (sempre ele no caminho dos franceses).
Na ocasião, o desempenho de Bacrot na Copa do Mundo e o seu rating (um dos maiores da época) foram suficientes para garantir o enxadrista no Torneio de Candidatos, na época disputado por 16 jogadores, em sistema eliminatório, no qual os quatro primeiros se classificaram para o Campeonato Mundial, realizado com oito enxadristas. Bacrot foi eliminado nas oitavas de final, 5,5 x 3,5 para Boris Gelfand (outro algoz em comum com Vachier-Lagrave).
Em 2007, Bacrot voltou a Copa do Mundo e caiu na terceira fase para o russo Sergey Karjakin. Em 2009, eliminação nas oitavas de final. Bacrot ainda disputou as Copas do Mundo de 2011, 2013 e 2017. Antes de grande atuação de 2005, Bacrot também esteve na Copas de 1998, 2000 e 2004.
Lautier
Kasparov x Lautier 2002
De acordo com o chessmetrics, Joel Lautier esteve entre os 16 melhores do mundo em 1995.
Em 1993, o francês se classificou no Interzonal da FIDE e disputou o Campeonato Mundial de 1996. Doze enxadristas participaram do evento em formato eliminatório. Lautier foi derrotado na primeira fase, 4.5 x 3.5 para o holandês Jan Timman.
Nas Copas do Mundo de 1998 e 1999, Lautier foi eliminado pelo grande algoz francês, Boris Gelfand.
Já em 2000, Lautier foi derrotado pelo brasileiro Rafael Leitão, 1.5 x 0.5 na primeira fase. Veja aqui a partida decisiva desse match.
Em 2002, Joel Lautier teve boa atuação e foi até as quartas de final, quando caiu diante Vassily Ivanchuk.
A última participação de Joel Lautier em uma Copa do Mundo ocorreu em 2005, derrota no clássico francês das oitavas de final, 2.5 x 1.5 para Bacrot.
Outros enxadristas franceses em Copas do Mundo
Laurent Fressinet (2017, 2015, 2013, 2011, 2009, 2007).
Edouard Romain (2015).
Andrei Istratescu (2013) – enxadrista romeno que representou a França durante um breve período.
Sebastian Feller (2011).
Vladislav Tkachiev (2009, 2007, 2004, 2002, 2000, 1999).
Igor Nataf (2002, 2000).
Gaetan Sarthou (2000).
Olivier Touzane (2000).
Christian Bauer (1999).
França em Olimpíadas de Xadrez
Os franceses estiveram em 38 das 42 edições das Olimpíadas de Xadrez. Nas premiações individuais conquistaram seis medalhas de ouro, cinco pratas e três bronzes. Porém, mesmo com grandes times, nunca conseguiram subir no pódio por equipes.
A França esteve no top 10 em nove ocasiões. As melhores participações ocorreram em 1984 e 2006, quando terminou na sétima posição. Em Baku 2016, ficou em oitavo lugar.
Defesa Francesa
Uma das aberturas mais populares da atualidade, a Defesa Francesa foi batizada após uma partida por correspondência entre as cidades de Londres e Paris em 1834. Essa não foi a primeira vez que a sequência 1.e4 e6 foi colocada em prática, mas a história ficou assim registrada e a abertura ficou com o referido nome.
Platini ou Philidor? Zidane ou La Bourdonnais? Henry ou Bacrot? Mbappé ou Vachier-Lagrave? A França mete mais medo no futebol ou no xadrez? Deixe sua opinião nos comentários.
Gostou do artigo? Então compartilhe nas redes sociais.
O pessoal ainda joga xadrez no café ?