Grandes Enxadristas: A História de Svetozar Gligoric
Origem
Os mais jovens sequer devem ter ouvido falar da Iugoslávia, mas esse país foi muito importante para o desenvolvimento do xadrez no século passado. Localizado no sudeste da Europa, na região dos Balcãs, foi extinto em 1991 e acabou dividido em sete países: Sérvia, Croácia, Bósnia e Hezergovina, Eslovênia, Kosovo, Montenegro e Macedônia.
O legado deixado pela Iugoslávia ao xadrez é vasto, não por acaso a Sérvia ainda é um dos países com mais Grandes Mestres no mundo. Foi na Iugoslávia que surgiram os Informadores e as Enciclopédias de Aberturas – classificadas pelo código de Rabar: A,B,C,D e E, materiais importantíssimos para o desenvolvimento de qualquer enxadrista na era pré-computadores.
Também foram organizados muitos torneios importantes na região. Por essa razão, segundo Garry Kasparov: “na segunda metade do século XX, a Iugoslávia se tornou uma autêntica Meca do Xadrez”.
Nesse contexto, o principal nome do xadrez iugoslavo é Svetozar Gligoric. Nascido em 1923, aprendeu xadrez aos 11 anos e foi um dos maiores enxadristas do mundo nas décadas de cinquenta e sessenta. Infelizmente, também foi prejudicado pela II Guerra Mundial (1939-1945), período em que lutou no exército do Marechal Tito contra o exército alemão.
Che Guevara observa os lances de Gligoric
Carreira
Depois do período caótico, Gligoric fundou um Clube de Xadrez em Belgrado (hoje a capital da Sérvia) e organizou torneios regionais e nacionais. No torneio de Varsóvia (Polônia), em 1947, o iugoslavo mostrou sua força ao mundo ao vencer a competição com dois pontos de vantagem sobre Smyslov, Boleslavsky, Pachman e Sajtar.
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Logo Svetozar Gligoric foi reconhecido como uma ameaça pelos dominantes soviéticos. Durante um tempo, autoridades esportivas da União Soviética enviavam representantes em eventos com a presença do iugoslavo, a fim de acompanhar sua evolução.
Em 1950, Gligoric – ainda como MI – liderou a equipe da Iugoslávia campeã da primeira Olimpíada de Xadrez no pós-guerra. O ouro olímpico daquele ano foi conquistado em casa, na cidade de Dubrovnik (hoje na Croácia). A União Soviética não participou do torneio.
No total, o enxadrista representou seu país em 15 Olimpíadas entre 1950 e 1982, geralmente no primeiro tabuleiro. Além do ouro mencionado, conquistou seis pratas e cinco bronzes com a seleção nacional. Ou seja, durante trinta anos, a Iugoslávia esteve na elite do xadrez mundial, perdendo – na maioria das ocasiões – apenas para a União Soviética.
Reshevsky x Gligoric
Gligoric e o Campeonato Mundial
Por fim, em 1951, Svetozar Gligoric conquistou o título de Grande Mestre (GM). Na disputa pelo Campeonato Mundial de Xadrez, o enxadrista da Iugoslávia conseguiu se classificar para três Torneios de Candidatos. No famoso torneio de Zurique 53, o enxadrista não conseguiu uma boa atuação e terminou na 13ª colocação, entre os 15 fortíssimos participantes.
Em 1959, o Torneio de Candidatos foi realizado na Iugoslávia e, mais uma vez, contou com a presença de Gligoric. A classificação final ficou da seguinte forma: Mikhail Tal 20 pontos, Paul Keres 18.5, Tigran Petrosian 15.5, Vasily Smyslov 15, Svetozar Gligoric 12.5, Bobby Fischer 12.5, Friorik Ólafsson 10 e Pal Benko 8.
Gligoric x Fischer
Só o fato de participar de um torneio como esse demonstra a grande força do referido jogador. No entanto, o quinto lugar de Gligoric foi assim resumido pela imprensa iugoslava da época: “um resultado que não condiz com seus importantes êxitos nos últimos anos”. Ou seja, existia a expectativa que Gligoric pudesse lutar pelo título mundial contra Mikhail Botvinnik.
Em 1968, Gligoric teve sua última chance no Torneio de Candidatos. Agora no formato eliminatório, o iugoslavo enfrentou Mikhail Tal já nas quartas de final. Gligoric estava bem e dominava o match por 3×2. Mas Tal virou e venceu o duelo por 5.5 x 3.5.
Gligoric x Tal
Outros êxitos
Svetozar Gligoric ganhou o Campeonato da Iugoslávia em 11 ocasiões. Além de conquistar grandes resultados nos principais torneios da época, Gligoric venceu muitos dos grandes nomes da história do xadrez, como por exemplo: Fischer, Botvinnik, Petrosian, Smyslov, Tal, Keres, Korchnoi entre outros.
Legado
Gligoric também contribuiu para o desenvolvimento do jogo. Nesse ponto, as partidas do iugoslavo na Defesa Índia do Rei são clássicas e devem ser vistas por todos que queiram aprender essa abertura. Grande especialista da Índia do Rei, Kasparov também passou por esse momento: “Botvinnik me recomendou estudar a Defesa Índia do Rei a partir dos grandes intérpretes clássicos dessa abertura e Gligoric estava entre eles”, afirmou o ex – campeão mundial.
O legado de Gligoric também ultrapassa o tabuleiro em sua célebre frase, que acabou intitulando seu livro de partidas: “Eu jogo contra as peças”. O Grande Mestre refere-se ao jogo como uma luta cordial, nunca levando o confronto para o lado pessoal contra o oponente. No fatídico match com Tal, mesmo jogando em casa e com o público todo a favor, Gligoric “manteve a atmosfera do duelo amistosa e cordial, e a isso devo agradecê-lo”, recordou Tal.
Infelizmente, o cavalheirismo de Gligoric é incomum em muitos dos grandes confrontos de xadrez: Fischer x Spassky, Karpov x Korchnoi, Karpov x Kasparov, Kramnik x Topalov, entre outros. Por isso, seus ensinamentos sobre a conduta de um enxadrista serão sempre válidos.
Livro: “Eu jogo contra as peças”
Além de jornalista e organizador, Gligoric tornou-se árbitro internacional em 1972. Destaque para sua atuação nos matchs Kasparov x Korchnoi (1983) e no interminável duelo entre Kasparov x Karpov (1984). Faleceu em 2012, em Belgadro, aos 89 anos.
União Soviética e Iugoslávia dominaram o xadrez mundial durante algumas décadas no século passado. Quais são as três maiores potências enxadrísticas do século XXI? Deixe sua opinião nos comentários.
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Referências Bibliográficas:
Meus Grandes Predecessores – Volume III, Garry Kasparov.
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